Vômito virulento

os corpos nos caixões
empilhados
na cova comum

os corpos nos cubículos
empilhados
nos prédios da cidade

os corpos nas casas
entre muros e concertinas
nas ruas da classe C

os corpos nos barracos
apinhados
nos morros e quebradas

os corpos espremidos
nos ônibus lotados
nas vias congestionadas
de carros gente
e vírus

o suor dos corpos
acumulado nas mercadorias
limpas
do fedor dos corpos
do cansaço e das dores dos corpos
das horas investidas
(perdidas)
nas rodas dentadas da vida

a vida inteira
transmutada
numa profusão de rodas dentadas desencarnadas
dos corpos
a vida sublimada em massas infinitas
de cifras

as almas nos cofres
empilhadas
no PIB mundial

a morte intubada
na companhia de plásticos
e eletrônica
no caixão lacrado
corpo
ao pó voltarás
sem nenhum adeus

foi Deus
foi Deus
foi Deus que quis
e daí?

um vírus não tem alma
e se apossa do corpo
para se alastrar neste corpo
e para outros corpos
um vírus não sabe de si
nem da dor do corpo que ele toma
ou da dor dos que o amam
um vírus não quer a dor
dos corpos um vírus quer
apenas virar mais vírus
(às custas das vísceras do corpo)
até o infinito da virulência

e daí? e daí?

um cifrão não tem coração
e se apossa da alma
para se alastrar nesta alma
e para as outras almas
um cifrão não sabe de si
nem da dor da alma que ele toma
ou da dor das que a amam
um cifrão não quer a dor
das almas um cifrão quer
apenas ser mais cifrões
(às custas das vísceras da alma)
até o infinito das cifras

e daí? e daí?

uma sede de morte não tem compaixão
e se apossa do povo
para se alastrar neste povo
e para os outros povos
a sede de morte mal sabe de si
ou da dor do povo possuído
ou da dor triste dos que lhe resistem
mas a sede fascista quer a dor
dos corpos e almas e quer
ser mais sofrimento e morte
(às custas das vísceras do povo)
até a devastação da vida

e daí? e daí?

eu não sou coveiro
apenas encomendo o presunto
às milícias virais e antecipo
o encontro das almas com Deus
por isso eu sou o Capitão
das hordas selvagens dos céus
e seus sacerdotes me abençoaram
e os pobres diabos velhos e doentes
(imprestáveis de cifrões)
que se vão não vão em vão
é higiene da vida
nessa lida dura e escassa
só fica o duro
da engrenagem e a graxa
e se descarta o bagaço
minha bíblia sagrada
é rato na vagina
e choque no pau
de arara e daí?
sinto muito!

os caixões empilhados
na cova comum

as engrenagens das ruas
não podem parar

a sede de combustível dos motores
a sede de amor e sangue dos corações
a sede de corpos e almas da engrenagem abstrata que engole suores
e defeca cifrões
de seu corporodadentada de circulações
sede de sangue e suor sede
de balcões e vitrines do povo
vitrificado na fúria das máquinas
desejantes de cifras suor e sangue

todo mundo quer funcionar!
um vírus bate suas bioengrenagens microscópicas
com as rodas dentadas dos cifrões
disputando o mercado carnespiritual dos corpos
e a sede de morte ri
um riso fascista
e infiltra sua sombra podre nas frinchas da carne da
alma esfarrapada de combates

três pragas se digladiando no mesmo palco-
corpoalma no mesmo parco corpo no mesmo
povo se dilacerando desde as entranhas
da carnealma se ex-
plodindo desde os abismos
infernais do corpo e do povo
corpo e povo    duas casas
possuídas pela sedentíssima trindade:
cifras, vírus e sede de morte

os suores
higienizados
nos cálculos dos ganhos

as novas covas
abertas em série
como carros
num estacionamento
números
num balancete

as novas mortes
em séries ex-
ponenciais
linhas
num gráfico de pixels

os caixões
empilhados
na cova
comum

Il Duce Der Führer O Capitão
as sombras podres da alma
metástases por todo o espírito
do tempo do povo infernal
o gozo da tortura do domínio
a humilhação o assassínio
dos fracos em nome d
O Cristo

o abismo do abismo do abismo
ódio e rancor ódio
e rancor ódio
e rancor

vamos orar irmãos
para Deus iluminar
a alma dos nossos governantes
com sua luz compassiva
de ódio e rancor

os doentes
e mortos
amontoados
na enfermaria

os caixões
empilhados
na cova comum
foi Deus que quis
vida que segue
nada
pode parar
as rodas dentadas da morte
engrenadas
na maquinaria dos cifrões
e daí? e daí? e daí?

a oficina sagrada de Deus
e suas engrenagens de milagres
o milagre da multiplicação das cifras
o milagre da proliferação dos pobres
o milagre da disseminação do vírus
o milagre da virulência do desejo de
morte que se alastra nas massas ressentidas do Messias

as almas gangrenadas
as almas purulentas
as almas virulentas
untando as frias engrenagens
da maquinaria dos cifrões
com o fogo ardente do cristofascita
ódio e rancor

o ar pútrido de vírus
o vento gelado de cifras
o fogo de ódio e rancor
                                        soprados
num só bafor
pelo Deus-
Desejo-de-Morte
no pasto
seco da alma
do gado em agonia
              em carne viva
e alegre
     de sua sina suicida

o desconhecido da noite
caminha
entre a solidão e o abismo
uma pátria no punhal do ódio
     os caixões empilhados na cova comum
as sombras avançam no poço de lama
céu de sal chuva de punhais
nos corações coroados de alarmes
    os pulmões inflamados nos leitos lotados
as almas se aninham em grades
mentes-concertinas no concerto do medo
    as portas fechadas dos hospitais
o desconcerto dos céus
cavalga nuvens de mentiras
o bafo das bocas de fé
    a falta de ar até o último suspiro
a multidão de mendigos
do outro lado da rua
o enxame de zumbis infectados
da fé dos homens de bem
fecundados do espírito santo
    um corpo um número a mais

os motoboys e ubers atravessam o asfalto dos confins das cidades da patriamada entre as engrenagens de aço dos cifrões moendo almas e pulmões o deus infecta as vísceras do espírito de ódio e rancor um pastor vomita a sede de morte e cifras na boca abençoada de sombras dos fiéis nas engrenagens do morticínio moendo corpos e suores cagando um fluxo contínuo de cifrões ao infinito abstrato das cifras e o suor e o sangue e os corpos e os caixões caindo na cova comum das almas supérfluas flutuando entre o céu e os sete círculos emaranhados do inferno de ruas muros edifícios fios circuitos neurônios motores e chips

a roleta russa de vírus o funil das cifras a vida e a fortuna por um golpe de sorte um fio de acaso mas no coração de mãe do desejo-de-morte sempre cabe mais um milhares milhões de corpos fascistas contagiados da fúria das sombras da putrefação da alma em gozo do espírito das massas ejaculando a gosmavômitomerdaurinaepus da pestilência de ódio e rancor em nome de cristo da pureza do mundo da luta do bem contra o mal da punição do imoral se levanta um líder um guia um capitão-messias e sua boca-de-ânus nos convocando em massa nos transmutando em massa a chafurdar na sua divina massa de merda abençoada por santos sacerdotes missionários auxiliando o messias a tocar o berrante do apocalipse o rebanho ao abismo no pastoreio da morte

o ovo da serpente está sempre se gestando no útero da maquinaria abstrata das cifras na moenda de suores e sonhos nas rodas dentadas da alma transmutada em cálculos reluzentes o ovo do desejo-de-morte está sempre no útero de mamon o ovo de ódio e rancor o mesmo ovo fascista de sempre mais que estar o ovo é o ovo ser o gérmen do novo deus da morte uma engrenagem de trevas se fabricando a si mesma por entre as engrenagens das cifras uma engrenagem podre oculta na máquina reluzente das fortunas um monstro pronto para se parir-explodir de dentro do corpodentado das cifras um filho bastardo do cristomamon com a serpente de ódio e rancor

tudo começa num rio subterrâneo de merda num urro de raiva travestido num canto de amor a pedra fundamental a peça primordial da máquina de assassínio em massa é um canto de amor evocando a pureza imaculada das eras o paraíso perdido ofendido pela serpente infernal do pecado de morte morte aos pecadores morte às bichas morte aos macumbeiros morte aos comunistas morte aos políticos morte aos ativistas fogo na carne dos imorais fogo na face corrupta da terra em nome da inocência adâmica do mundo das almas alvas e viris dos filhos de deus do homem trabalhador puro e honesto pai de família das pessoas de bem amém




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