26 novembro, 2021

Pós

Eu 
Não estou pós-moderno,
Eu sou pós-moderno,
Completamente abduzido, ab-
Sorvido no entretenimento fútil da vida contemporânea,
Não tenho paciência para a declamação do poema,
Nem mesmo na voz irônica do Abujamra.
Não sou mais irônico nem fragmentado,
Sou cínico,
A fragmentação em Pessoa,
Quebra essencial,
Caco de um vaso que não houve,
Não tenho paciência de atravessar romances,
Quero apenas ficção científica nas telas.
Apocalipse zumbi,
Se o capitalismo é um beco sem saída
Suicida,
Que o mundo acabe então 
Pela mão invisível do Deus,
Cansei de imaginar utopias, buscar outras vidas,
Meu bem,
Enquanto o mundo não acaba
Vamos gastar, beber, dançar como loucos à beira do abismo.
Não tenho paciência para um vinil,
Eu quero três minutos de música ou menos,
Aquele pedaço viciante da canção,
Alívio imediato, a cena de impacto,
Pensar apenas no próximo
Negócio, festa, viagem, transe ou transa.
Viver sou eu
Gozar agora e esquecer
Ontem, amanhã, os outros, o mundo,
Esquecer tudo!
Não tenho paciência de escutar,
Conversar, entender, esperar
Nada!
Estou pleno apenas no instante
Em que me aplaudem!
 
 
La metamorfosis de Narciso - Salvador Dalí

 


17 novembro, 2021

Narciso (mise en abyme)

viv

eu ou si

perd

eu em

sonhos

acor

dados

em des

acordo

com a v

ida con

creta

ícaro

em fuga

aluci

nada

em que

da livr

e se des

pedaç

ando

no abis

into voo

látil

de um sí

sifo in

saci

áve

l

 



13 novembro, 2021

há galáxias

a poesia se perdeu

o poeta não existiu

ninguém leu


há galáxias

inscritas no vazio

a brilhar no céu

 

 

 

a poesia se perdeu

o poema não existiu

ninguém leu


há galáxias

perdidas no vazio

a brilhar no céu


10 novembro, 2021

O engenheiro onírico

Quando eu era menino, adorava brincar de carrinho. 
Então, construía estradas, pontes, estacionamentos, postos, 
calçadas e ruas, tudo muito rudimentar,
a imaginação é que sofisticava a obra. 
No meu sonho de olhos abertos 
aquele pequeno e tosco universo
ganhava detalhes, se movia, funcionava 
que nem uma cidade, melhor ainda, 
uma ultracidade cheia de Graça e Vida. 
Eram horas e horas absorto no parto 
de um mundo que se fazia 
com a terra vermelha do quintal 
e o cimento da fantasia. 

Depois que tudo estava pronto, 
finalmente chegara o grande momento 
de brincar de carrinho, de imitar os adultos 
na faina diária, brincar de viver, de ser 
gente grande de verdade! 
Mas como era chato! Não havia mais nada 
para se construir no chão do quintal 
nem nas nuvens da minha cabeça,
avoada desde aquele tempo. 

Eu nunca gostei de brincar de carrinho, 
eu queria mesmo era construir caminhos, 
estradas de terra 
para longe daqui,
estradas de sonho
para o sem fim de mim.

(Mas eu queria muito
gostar de brincar de carrinho
como todos os outros meninos)


João Colagem



O engenheiro onírico

Quando eu era menino, adorava brincar de carrinho.  Então, construía estradas, pontes, estacionamentos, postos,  calçadas e ruas, tudo muito...