13 janeiro, 2020

A alma podre do poeta



Do lado de dentro da máscara
burocrata, um solo putrefato
gesta uma flor feia e ex-
uberante, um poeta etílico
de rosto lúcido, límpido,
barbeado e banho tomado.

Do lado de dentro uma flor
suja, um olor fétido, enraizado
na face sombria da alma e, mais
ao fundo, se afunda no lodo
podre da cidade, alma de asfalto
e cimento, vidro e plástico, corpo
atravessado de sonhos e cifrões.

Do lado de dentro da fantasia feliz que desfila
no carnaval do dia a dia (das orações
e labutas, dos negócios, do gozo
cinza e furioso do consumo) se dis-
semina a onda bacante, a erva
daninha, praga sem serventia,
a poesia. 

Imagem de fundo: "O falso espelho" de René Magritte

07 janeiro, 2020

Alguma coisa


Alguém
presta atenção nas folhas
na praça dançando ao vento, no vento
que entra pela janela e acaricia
os poros, na memória lenta dos mortos,
no emaranhado de fios sobre a avenida,
no vai e vem sem sentido das formigas
humanas, nas ruas do dia cheias
de carros, nas ruas vazias
da noite, na noite de luzes
e gatos da cidade, no mendigo
que dorme na calçada, na letra
da música, em alguma
poesia?

Alguém consegue      prestar atenção
                                 em alguma coisa?

O engenheiro onírico

Quando eu era menino, adorava brincar de carrinho.  Então, construía estradas, pontes, estacionamentos, postos,  calçadas e ruas, tudo muito...