13 dezembro, 2017
Nine
O réu é de origem pobre e oriundo da região Nordeste
Criado e crescido na metrópole de São Paulo
Foi treinado e exerceu trabalhos braçais
E fala mal a língua pátria
O que torna, de saída, todos os seus atos suspeitos
Não é negro de pele mas exames acurados de sua psique
Evidenciam uma alma enegrecida, certamente por conviver,
Desde tenra idade, muito misturado à gente de cor e paupérrima
O que eleva consideravelmente a suspeição de seus atos
Como atenuante, o réu ascendeu na vida, ocupou cargos importantes
Usou terno e gravata exigidos pelo exercício do cargo
E tem, atualmente, um padrão de vida relativamente elevado
Porém, o atenuante é completamente anulado
Pois o réu, embora livre da praga da pobreza
Insiste em trazer dentro de si a alma negra
E pobre e nordestina e de trabalhos braçais
E barba muito suspeita e recusa em elevar seu português operário
À língua culta dos doutos que somos nós
Declaramos, então, o réu indigno dos cargos que ocupou
E o proibimos de ocupar este ou qualquer outro cargo
Exclusivo da gente clara e esclarecida, como nós
Declaramos também o réu indigno de nosso convívio
Pois fala mal, não se barbeia e certamente cheira mal
Como costuma acontecer a todas as almas ou corpos empestiados
De pobreza, negritude, Nordeste ou trabalhos braçais
Em conclusão, o réu é culpado
Não por ser nordestino, de alma negra e pobre e braçal
Pois reconhecemos a utilidade de tais tipos
E com eles simpatizamos, desde que se resignem
À sua condição servil e nos sirvam com amor
Pois precisamos de domésticas, babás, motoristas,
Garçons, pedreiros, garis e jagunços
Para o bom funcionamento de nossas casas e ruas
O réu é culpado pelo crime hediondo
De querer viver conosco em nossa casa grande
Sem perder a alma negra e pobre e nordestina e braçal
E mais culpado ainda por fazer crer à ralé que nos serve
Que nossa bela e exclusiva casa grande é dela também,
Que a casa é de todos: pretos, pobres, nordestinos, braçais...
Quanta heresia! É culpado, mil vezes culpado
De querer nos fazer conviver como iguais (oh! horror)
Oh! horror) com a gente serviçal, tosca e fétida!
Prendam o réu!
Em nome de Deus e da família!
Torturem a ele e a seus companheiros!
Ponham-no no tronco e lhe apliquem mil chibatadas!
De pau de arara veio, ao pau de arara retornará!
Cortem-lhe a cabeça! Mas não rapidamente, que o réu sofra antes,
Que perca a mulher, que seus filhos e netos paguem por seu atrevimento
Que seus companheiros sejam perseguidos! Que o seu sonho
De promover a ralé malcheirosa à dignidade de nós doutos
Desmorone diante de seu olhar triste e impotente!
Que ele perca todas as batalhas! E que gozemos,
Que gozemos no ódio que nos move a sua dor mais funda!
Gozemos a tristeza sem esperança da ralé que o tem como ídolo!
E que nossa Pátria amada verde amarela seja desinfetada,
Para todo o sempre, de seu corpo e de sua alma
Negra, vermelha, criminosa!
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