Caçamba
Há os que limam
ferozmente
as palavras
embora mintam
que o fazem
pacientemente.
Há os que se deixam tomar
pela ferocidade do verbo
crendo (cândidos) que são
beijos suaves da língua
encantada das musas.
Mas desconfio que nem estes
nem aqueles nem ninguém
sabe os modos e os motivos
dessa fera que é ritmo
espanto e mal-entendidos.
Há ainda as coisas as bocas o mundo
de onde as palavras brotam
e para onde gritam e se deságuam
tão necessárias quanto impotentes.
Limar palavras é limar
o ser das coisas
até o osso do ser
ou seria uma camada
a mais do parecer
acrescida ao ser
que talvez nem haja?
Este olhar táctil e agudo
às coisas e seus absurdos
se escreve de ouvido
se sente com o fígado
mas não desvela o mistério
das ruínas do mundo.
O canto que se canta
é mais uma caçamba
a despejar seu entulho
de enganos e enigmas
no caos do monturo
insondável da vida.
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