na pátria abissal

as fardas cobrem corpos negros e pobres
mal treinados e mal pagos
para controlar negros e pobres
a revolta não se sabe revolta
o xadrez transborda carne negra

os negros e pobres se socorrem
com um deus um punidor
praga de ódio cuspida pelo pastor
na alma dos fiéis desesperados
a classe média frequenta seus shoppings suas igrejas
e cheira seu pó em segurança
nas ruas da periferia um funk pornográfico
um rap revoltado   uma cabecinha pronta
para um sniper   uma menina passeia
nos becos    uma bala um estupro um dado estatístico
na rotina de sangue da cidade
uma negra a mais
ou a menos   que diferença faz?

as pessoas de bem passam velozes na rodovia   nos aviões
sonham turistas e homens de negócios
ganhar e gastar   grana e ócio
enquanto as celas transbordam carne barata pelas grades
e os cemitérios recebem mais caixões baratos
com corpos jovens
negros e pobres
mocinhos e bandidos

e Mamon ri
de tão gordo
da vida miserável de seus súditos
a vida dos que nasceram errado
a vida dos que nasceram ratos
e jamais se tornarão gatos
mas também da vida felina dos predadores
plena
de ódio e indiferença    Mamon ri
das vidas todas de seu reino
vividas pela metade

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