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O engenheiro onírico

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Quando eu era menino, adorava brincar de carrinho.  Então, construía estradas, pontes, estacionamentos, postos,  calçadas e ruas, tudo muito rudimentar, a imaginação é que sofisticava a obra.  No meu sonho de olhos abertos  aquele pequeno e tosco universo ganhava detalhes, se movia, funcionava  que nem uma cidade, melhor ainda,  uma ultracidade cheia de Graça e Vida.  Eram horas e horas absorto no parto  de um mundo que se fazia  com a terra vermelha do quintal  e o cimento da fantasia.  Depois que tudo estava pronto,  finalmente chegara o grande momento  de brincar de carrinho, de imitar os adultos  na faina diária, brincar de viver, de ser  gente grande de verdade!  Mas como era chato! Não havia mais nada  para se construir no chão do quintal  nem nas nuvens da minha cabeça, avoada desde aquele tempo.  Eu nunca gostei de brincar de carrinho,  eu queria mesmo era construir caminhos,  estradas de terra  para longe daqui, estradas de sonho para o sem fim de mim. (Mas eu queria muito gos

Ultimato

Pobres modernos perdidos no impasse das palavras a cada poema o fim da linha  cada passo a um passo do abismo. Do silêncio do livro o poeta grita à multidão de surdos:         o mundo está moribundo         o sentido é absurdo         o buraco não tem fundo         se eu me chamasse Raimundo... A solução seria rimar o branco da página com o niilismo do não? Pobres modernos poemas tão belos mas ermos, enfermos fragmentos de fina ironia labirintos em volta do vácuo ecos sem voz de fato sombras de nenhuma Ideia.         Mais um gole e se acabou         palavras não dizem mais nada         absintos de Rimbaud. Pobres modernos este vai ser mesmo o último não há motivo pra mais tudo já foi dito.         Amanhã o poeta se trai         e mais um poema floresce         na vida que se esvai.

Gaza - Palestina

o horror     o horror   ó Palestina      a mãe procura os cadáveres dos filhos sob os escombros    o choro           da menina de pele queimada   a morte ao vivo     nas telas da internet      o horror que se repete e se repete e se repete      armênios   Gueto de Varsóvia    Auschwitz os genocídios    de russos e chineses          Vietnã    Camboja    Iraque   Sudão      Líbia   Síria   Iêmen    tantos outros novo milênio    século XX    Modernidade         tantos indígenas   africanos   orientais                 ó Palestina sois todos eles agora        sois a síntese                 de todos massacres                          condensados            no circo de horrores de Gaza não entra comida ou remédio    só o ódio        irremediável dos soldados                     e a chuva de bombas  sobre casas e escolas     hospitais e mesquitas       não há refúgio ou descanso em Gaza            onde as pessoas morrem agora                 de morte matada                        por bomba ou

Nada com nada

Compor canções edificantes ou terrificantes, edificações exímias sobre o Nada que é a vida, formas perfeitas com a carne das palavras e a alma do artista. Voz séria, ébria ou irônica a ritmar sem fim... Não, hoje eu quero ir ao dentista e errar depois pelo Centro  esquecido de Goiânia, com suas praças e vielas que escondem calçadas quebradas, frestas de onde brotam capim e casinhas art déco . Hoje eu não quero alçar a Voz aos abismos nem às alturas do Nada ou do Ser, quero ser o corpo que sou, pó sem voo, mero cisco no chão de asfalto e cimento. Nenhum regozijo, sequer um lamento. Hoje eu não quero nada com nada.

sol alto

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uma língua de silêncio cintila no mar de ruídos da avenida um mar largo de ruas e ruínas tragados na voz muda ó canto que não canta no asfalto nasce o poema: sol alto  x

Precipitação

Pra que tanta angústia insone ansiedade? Esse medo de chuva... Olha as árvores dançando ao vento da chuva que vem secando ao sol da chuva que passou. Versão alternativa: Pra que tanta angústia insone ansiedade? Esse medo de chuva... Olha as árvores dançando ao vento do temporal que vem secando ao sol depois do mau tempo que passou.

Qual sentido?

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círculo virtuoso?                     O                       vicioso? ou  

A fazenda de trevas

ou: O abismo de Narciso A exigência de ser amado é a maior das pretensões (Nietzsche)  Ah, se uma rês pastou em sua fazenda, gostou do pasto e depois se afasta! Mesmo que não deixe de amá-lo, a simples diminuição do amor (ele faz contas com o amor) ou o interesse por outras pastagens lhe é insuportável. Enquanto está entre as suas cercas, pastando em seus campos, a rês vale muito pouco para ele. Mas se ela ousa fugir para experimentar novas pastagens, é como se tornasse um Deus ou Demônio muito maior que ele, que se carcome por dentro. De ciúme. De inveja da rês alada que é feliz sem o seu pasto. De inveja dos outros fazendeiros e de seus pastos fartos. De raiva de si mesmo e da pouca sustância de seu pasto magro.  A rês é terrível: não lhe gosta, como pode pastar feliz longe de suas terras? Uma rês mal agradecida, malvada. Ele quer que ela se sinta infeliz longe de sua fazenda e volte ao cativeiro, ele quer a tristeza do que lhe escapou às mãos. E a rês, mesmo longe, lhe quer bem, ain

Microparaísos no inferno

Guerras guerras guerras Estou cansado de saber das guerras Quero apenas contemplar as guelras Dos peixes lentos na lagoa calma E as garras Afiadas dos gatos Guardadas No macio das patas

cega revolta

extrair até o osso do suor humano horas e horas nas salas nas ruas olhos cansados nas telas braços exaustos nas máquinas por pão e água e migalhas de entretenimento carnes e almas gritam aflitas em vez de chutarem o bezerro de ouro e reinventarem a tribo comum procuram bodes expiatórios e engrossam as fileiras fascistas  

Seção de Condicionamento Límbico

ao Eduardo companheiro de limbo   Oito horas numa sala com ar condicionado olhando para uma tela: sistemas, processos, planilhas... Ó pão nosso de cada dia! Ó cálice que não se afasta! E a alma condicionada geme em silêncio: amém!   Oito horas numa cela não é para minha natureza seria para a condição humana de alguém?

pai-poesia

meu pai nunca precisou fazer poesia ele (se) faz do dia após dia seu firme compasso de vida poesia sem letra nem melancolia

poesia

grafia das minhas aluações da alma fragmentações explícitas do meu eu baldio exposição dos fios desencapados de dentro bálsamo precário pr'esse coração sem jeito único ofício concreto que tenho

pai

meu pai meu contrário (como eu queria ser) inteiro cabeça e pés no chão do dia

Uma cama entre dois turbilhões

Para a Zezé Tempos tumultuosos lá fora dores, lutas, labutas presságios de fim de mundo Aqui dentro o coração revolto um poeta de cabeça fraca Amanhece chovendo manso sinto o doce odor da sua respiração misturado ao suave suor noturno de sua pele atlética A bagunça dos lençõis e cobertas mal oculta a harmonia da cena e a força do seu sono ressoando luz contra as sombras do mundo e meu coração soturno

água árida

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esperamos da palavra do poeta que ela frutifique nos ensine e faça ver um novo mundo novo modo de viver a vida plena para nós e o povo neste tempo afeito a afetos em pó pós-moderno pós- humano o poeta pode só nos sussurrar em silêncio (do precipício das palavras) o seu grito mais estridente    

Enquanto Mamon enche a pança...

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Argentina Israel USA Brasil Europa Irã Médio Oriente Rússia Índia África China a praga fascista se alastra de mãos dadas com a erva daninha do fanatismo e contra eles se ergue apenas o terror do estado tirano inferno contra inferno soldados de Deus   sol- dados da morte    a destruição pela destruição    o mundo reduzido a cinzas   o humano ao rés-do-chão ao nível do ver- me    

Desejo impotente

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Stella

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pobre mulher negra louca analfa todas as marcas todas as chagas vivia no fausto das palavras poeta e não se sabia existia em estado de poesia  

mundo miojo

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não há mais tempo ! agora é tudo agora tem mix tura fina? não só remix in stante in stável in stantânea eter nidade a alma surfa a super fície descontí nua de links a alma nua uma montanha de likes a alma crua um vale de cifras es pelho meu ex iste algo a não ser eu? qual mesmo a senha da minha sanha? pro dutividade pro atividade pro fissionalismo pro stação tripalium da tripas coração irmão sinta ódio com  muito amor aleluia abra o olho você con cegue meu bem o mundo é um miojo vai cozinhar teus sonhos empapar as ilusões em nojo

sabedoria do pó

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as pessoas    passam os poetas    passam até os poemas passam as fábulas  as línguas as galáxias     tudo passa ao encontro de ninguém  em lugar nenhum então   por que diabos os acasos do universo urdiram um corpo que se sabe e sabe do passar de tudo  mas quer   por tudo não passar jamais?